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domingo, 2 de maio de 2010

PARTICIPEM DAS OLÍMPIADAS DE LÍNGUA PORTUGUESA








Um poema por dia: homenagem a João CabraL
07-Abr-2010
"Eu gostava, sobretudo, era de ler. Eu tenho impressão que eu escrevia porque eu lia. Mas o que eu gostava mesmo era de ler. Agora, para freqüentar um círculo literário, eu me justificava escrevendo. Mas minha paixão mesmo era a leitura".(JCMN)
Quando soube de uma mostra dedicada ao poeta e diplomata João Cabral de Melo Neto, aventurei-me com quase cega avidez em saber melhor dela na virtualidade da Internet, estando certo e seguro de que ela acontecia num dos tantos espaços culturais da capital paulistana. Na tela um João Cabral um tanto quanto jovem e risonho. Atrás, como se ele tivesse acabado de escrever na parede de fundo, em letras vermelhas de faca e tinta sanguínea, a frase que dava título à mostra.Era um dos últimos rabiscos que o poeta havia feito antes da morrer, pensando em um possível título para um novo livro: Um poema por dia.

Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.(...)
(in Tecendo A Manhã)

Fui lendo com a maior pressa os informes da página virtual. Com caneta em punho e naco de papel para anotar endereço, com corpo e espírito prontos para sair de casa, percebo dura e concretamente que a mostra não estava no meu pedaço, na cidade coração que abriga tanto e tudo. Estava no centro do Rio de Janeiro, pleno de História e sonhos. Ficara assim em descompasso entre a minha possibilidade e o meu desejo. Não tinha promessas ou planos de ir ao Rio. Respirei fundo. Olhei a paisagem da minha janela que verdejava alguma coisa. A tela me convidava num abraço carioca. Alguns rios do poeta, veios da poesia estavam a minha espera naquele momento rápido e único.Fui averiguando como os cliques e o olhar tudo o que o site me proporcionava na outra aventura de compensar a não ida à mostra tão instigante e tão interessante. (Quem sabe alguém do Rio nos conte da sua visita).

(...)“O tempo do poema não há mais;
há seu espaço, esta pedra
(in O Autógrafo)

Senti na pele frases de nossos companheiros de Comunidade quando, muitas vezes, não podem estar presentes ao vivo e a cores em acontecimentos aqui indicados.

Olhei os comentários. A maioria deles dialogava com o meu sentimento daquele instante. ”É uma pena que a terra natal de João Cabral não tenha a oportunidade de ver a exposição” . Eu arremato de forma otimista: Quem sabe se esta exposição não será adotada por várias cidades? Vamos aguardar.

Com a cabeça a todo o vapor fui me lembrando, até onde pude, dos meus primeiros contatos com a poesia de João Cabral, por ocasião de um curso de extensão universitária nos idos de 80.Arrebanhei na mesa alguns livros da época.Folheei um, bastante amarelado e gasto, com muitas anotações a lápis, como se retirado da minha mostra pessoal.

Fui relendo as velhas páginas. Um eterno surpresar...

E fui selecionado alguns fragmentos pensando no deleite de quem visita esta nossa praça da Comunidade Virtual.

“Catar feijão se limita com escrever:
joga-se os grãos na água do alguidar
e as palavras na da folha de papel ;
(in Catar Feijão)

Como quem investiga uma foto recém tirada da memória, conferi um primeiro trabalho. Nele, um poema em especial: Os Vazios do Homem. Lembro-me de ouvir comentários inspiradores por ter juntado à minha leitura o poema transcrito em um grande tecido que ficou pendurado na sala feito vela jangadeira.No lugar das palavras “vazio(s)” deixei buracos, cortes de facas no tecido. O poema mostrava concretos vazios, esponja cheia de vazios. Aquele móbile de palavras e buracos, os vazios da alma humana, ficara latejando no refletir sobre todas as coisas. E sobre as palavras. E sobre o arquitetar do poeta.

(...) “Os vazios do homem, ainda que sintam
a uma plenitude (gora mas presença)
contêm nadas, contêm apenas vazios:”(...)
(in Os Vazios Do Homem)

Continuei o navegar. Imaginei cores, tons, vieses, marcas dos papéis das cartas e de toda a herança física interessantemente exposta aos admiradores da poesia e do poeta. Com desespero enternecido pus-me a vislumbrar alguns pertences de João Cabral que pudessem alimentar um pouco a não-visita à exposição. Parecia sentir os cheiros dos objetos expostos. Como isso atiça a nossa curiosidade! E os nossos desejos carentes!

Assisti a alguns vídeos sugeridos. Extrapolaram em deleite compensador e momentâneo. Vale para muitas coisas de nosso viver pessoal e pedagógico. É só clicar e ver. Depois conte para nós. Você se emocionará, por certo, enredado em tão belos depoimentos!

(...) “E as vinte palavras recolhidas
nas águas salgadas do poeta
e de que se servirá o poeta
em sua máquina útil.”
(in A Lição De Poesia)

Sabemos que a obra poética de João Cabral caracteriza-se por um rigor estético.É uma poesia que nos causa estranhamentos porque é essencialmente cerebral.O poeta não recorre ao phatos (paixão) para criar a atmosfera poética, mas a uma construção elaborada e pensada da linguagem e do dizer da sua poesia. Podemos até fazer algum levantamento de palavras usadas na sua poesia: cana, pedra, osso, esqueleto, dente, gume, navalha, faca, foice, lâmina, cortar, esfolado, relógio, seco, mineral, deserto, vazio, fome.

Ler João Cabral é difícil? Talvez seja, talvez não. Descobrir a sua poesia é um jogo interessante a se fazer. Dar-se a conhecer o fazer do poeta visitando alguns de seus poemas e entrando pela porta do como será que ele escreveu, como escolheu as suas palavras e as organizou no branco da pedra do papel é um caminho. É como se a lucidez se entregasse ao fazer poético certo do seu fio e corte.É uma proposta lúdico-pedagógica, a da reflexão sobre a linguagem que abre no seu fazer um leque reflexivo e criador ao mesmo tempo.Oficio e arte na mesma pedra e palavra.

Montar e desconstruir as leituras que vão se realizando entre si, esse jogo - o dizer e o fazer - não é útil para os nossos trabalhos de ensinar?A leitura antiga dilui-se na outra e a reinventa. Fluida e mote.Força e motriz.E assim a poesia se abre de intensas visibilidades. Fico pensando que esse aspecto lógico e matemático da poesia mineral de João Cabral pode chegar às mãos dos alunos num jogo curioso e interessante de sentir e pensar as palavras como algo instigador e lúdico. “uma lucidez que tudo via porém luz de uma tal lucidez que mente que tudo podeis.”

“Uma educação pela pedra: por lições;
para aprender da pedra, frequentá-la;”(...)
(in A Educação Pela Pedra)

De um sentimento leitor de agora, trazido em tempo do relógio vivido e relembrado, percebo alguns lances dessa eterna brincadeira: o ofício de escrever. Vislumbro sutilezas, galhofas ou ironias e sarcasmos feitos de poeticidade objetiva e extrema que tocam de leve o simples do cotidiano humano, nosso lugar comum.

Um poeta crítico ou um poeta com poeticidade crítica? Jogos e sentidos. E por isso talvez que nos engendra e nos intimida esse fazer poético tão lógico e tão profundo.

(...)Ӄ mineral , por fim,
qualquer livro:
que é mineral a palavra
escrita, a fria natureza
da palavra escrita.”
(in Psicologia Da Composição)

Fui me deliciando com tudo o que vi no meu passeio virtual. E para quem puder, vale a indicação. Aí vai a ficha técnica da mostra multimídia: Um poema por dia. Está no Centro Cultural da Justiça Eleitoral, no Rio de Janeiro. Com a curadoria de Inez Cabral, filha do poeta homenageado, o evento apresenta fotos, projeções, vídeos e entrevistas com o escritor e também exibe cartas, poemas e manuscritos – em parte inéditos – do acervo da família. A obra Morte e vida Severina, por exemplo, é mostrada em textos, fotos e fonograma da música original composta por Chico Buarque para a primeira montagem da peça, em 1965. A mostra está concebida e organizada em quatro espaços:

Vida e infância: fotos, poemas e depoimentos do poeta sobre sua vida, sua infância. Uma “autobiografia” selecionada por sua filha. Amigos e Vida profissional: fotos, depoimentos em vídeo e cartas de amigos e colegas. Paixões: textos, poemas, trechos de filmes; fotos e música da montagem para Morte e vida Severina (65); o time do América (do Rio e de Recife); a mulher; Sevilha e o Recife. Museu de Tudo - parte “física” do acervo, os manuscritos, as primeiras edições, os textos inéditos. O Centro Cultural da Justiça Eleitoral fica na Rua Primeiro de Março, 42, Centro, Rio de Janeiro. Mais informações: 21-2253-7566.

(...)Aquele rio
é espesso
como o real mais espesso.(...)
(in O Cão Sem Plumas)

E assim foi. Fiz a visita virtualmente. Quem sabe a farei de bom grado e de coração presente no Rio? Confesso que senti falta do imaginado toque perto do olhar. E dos cheiros fantasiosos emanados dos objetos, cenário de singela vida poética deste Severino poeta. Mas, por hora, pude adentrar-me por outras memórias, rios e versos, lembranças e pedras deste singular poeta que nos enobrece de raiz e céu.

E por nisso falar: há alguma mostra em seu lugar que a gente possa conhecer virtualmente?

Antonio Gil Neto

Mais sobre João Cabral de Melo Neto?

Acesse: www.literal.com.br/tag/joao-cabral e veja:

Um comentário:

PINDORETAMA DE TODOS NÓS disse...

AQU EM PINDORETAMA ESTAMOS TRABALHANDO EM VÁRIOS EVENTOS COM O GESTAR II.
PARABENS PELA MATERIA